Não sei porquê, hoje lembrei-me desta cena...
terça-feira, 26 de maio de 2009
sexta-feira, 22 de maio de 2009
O fim do modelo do investimento estrangeiro
Desde que abriu que a Autoeuropa tem sido um case study da indústria portuguesa. Considerada como a fábrica mais importante de Portugal, devido ao número de postos de trabalho directos e indirectos que gera, à componente tecnológica que representa para a indústria portuguesa, e à sua contribuição para as exportações industriais de Portugal. Boa parte das vezes que se fala da indústria portuguesa, fala-se da AE e com exagero, como se a indústria automóvel portuguesa tivesse começado com esta empresa. O que não é de todo verdade: entre os anos 60 e 80, ao abrigo da Lei da Indústria Automóvel de 1962, os automóveis a serem vendidos em Portugal tinham de ser montados cá com 25% de incorporação nacional, levando a que surgissem mais de 20 fábricas de automóveis, para além de muitas outras que lhes forneciam componentes de vária ordem.
Nos anos 80, e perante o fim deste modelo motivado pela adesão à CEE, foi um grande objectivo do governo de Cavaco Silva atrair o investimento estrangeiro para a construção de uma grande fábrica de automóveis moderna, que desse vazão à indústria de componentes automóveis entretanto herdada, e cujas exportações ajudassem a diminuir o enorme desiquilíbrio de transacções externas que começava a fazer sentir.
Já antes tinha havido tentativas nesse sentido desde os anos 60, junto de vários construtores. No início dos anos 70, com a Alfa-Romeo, propôs-se Sines, para produzir o Alfasud. No final dos anos 70 e princípios dos anos 80, com a Ford, Citroën e Renault, a todos sendo proposto Sines ou Setúbal. Só o último resultou mas de forma deficiente: sendo a Renault uma empresa pública francesa, o projecto assumiu contornos de ajuda económica, com os franceses a ditarem as condições, dispersando a produção para Aveiro (o que permitia trabalhar com as fábricas espanholas, mas menos bem com a de Setúbal), e sem a parte mais importante e cara, a oficina de fabrico de componentes de paineis de carroçaria (a "press shop"), que viriam de Espanha. Na prática, ficou-se com mais uma linha de montagem semelhante a outras que já existiam, desta vez a consumir mais componentes portugueses, e com enormes ajudas e favorecimentos por parte do Estado, que era sócio na Renault Portuguesa. Criou postos de trabalho, ao mesmo tempo que, devido à crise, fechavam outras fábricas de montagem portuguesas. As empresas de componentes, essas sim ganharam encomendas e uma injecção de tecnologia e eficiência. No final dos anos 90, e dada a atracção por investir no Leste, a Renault (isto é, o Governo Francês) achou que já tinha ajudado Portugal o suficiente e fechou a fábrica.
No projecto Autoeuropa (na altura projecto Ford-Volkswagen), o Governo teve o bom senso de aprender lições dos projectos anteriores, e procurou não repetir os erros. Setúbal foi logo avançada como localização preferencial, em vez de Sines, e exigia que a fábrica dispusesse de "press shop". Na corrida à fábrica da joint-venture Ford-VW estava Portugal (Setúbal), a então Checoslováquia (Bratislava), e Espanha (três localizações). A Ford, que tinha estudado Setúbal anteriormente, fez a nova análise de projecto, análise essa que incluia 190 critérios, que íam desde as acessibilidades, à disponibilidade de fornecedores locais, à rede eléctrica, qualidade do ensino, sistema de saúde pública, segurança, eficiência dos transportes públicos disponíveis para os trabalhadores, às leis laborais e frequência da ocorrência de greves e, obviamente, impostos e ajudas estatais.
A localização de Setúbal pelo excelente acesso às rotas marítimas, a meio caminho entre o norte e o sul da Europa, foi um ponto muito forte. Mas, no final, a Ford escolheu uma localização em Espanha. O mesmo fez a VW, mas em local diferente. Não chegando as duas empresas a um acordo sobres essas, e descartando Bratislava, debruçaram-se de novo sobre a terceira localização em Espanha - Huelva - e Setúbal. Huelva também tinha boa acessibilidade marítima, tinha uma avaliação geral melhor que Portugal, e os governos central e regional estavam dispostos a conceder ajudas generosas. Perante isto, o Governo de Cavaco Silva respondeu com o único argumento que restava: dinheiro.
Era um projecto essencial para o país, perante a desindustrialização que se estava a dar e, com a aproximação das eleições de 1991, o Governo Português abriu realmente os cordões à bolsa para ganhar a corrida. Cobrindo sempre cada novo valor apresentado pelos espanhóis, chegou-se a um ponto em que estes desistiram de dar mais. Ganhou Portugal, mas com ajudas gigantescas, num excelente negócio para a Ford-Volkswagen.
A produção do MPV (o monovolume VW Sharan/Ford Galaxy/Seat Alhambra) começou em 1995, com 55% de incorporação nacional, sendo que dos 45% importados, a maior parte vem de Espanha. Apesar do grande sucesso, a Ford abandonou o projecto passando a ser apenas VW. Mas, e apesar de ser a fábrica mais eficiente de todas as da VW, a capacidade instalada só foi bem aproveitada nos primeiros anos. A vinda de um segundo modelo demoraria anos a ser conseguida. O governo de Durão Barroso/Paulo Portas propôs a Sodia, a antiga fábrica Renault em Setúbal à VW, em que a produção do pequeno VW Lupo seria uma das contrapartidas da compra de submarinos de fabrico alemão para a Marinha Portuguesa. À VW, o que interessava era aproveitar Palmela, mas os novos modelos persistiam em não vir para Portugal. Finalmente, e sendo um das contrapartidas dos submarinos, veio a produção do VW Eos, mas com muito pouca incorporação nacional.
Mais tarde veio outro modelo de nicho, o Scirocco, de novo com grandes ajudas do Estado e poucas peças portuguesas, e chegou-se mesmo a falar no Polo. Mas com a crise, está de novo em cima da mesa a ameaça do fecho da Autoeuropa. Se das outras vezes, talvez tenha sido uma ameaça negocial para obter mais apoios do governo, agora o cenário é outro: o de crise, de excesso de capacidade instalada, e de proteccionismo alemão.
E aqui é que está a questão que agora afecta economia portuguesa em geral. Durante décadas, os governos portugueses abriram portas à concorrência estrangeira, e apoiaram fortemente o investimento estrangeiro, por vezes fraudulento. E enquanto se deram facilidades e muitos e muitos milhões a empresas estrangeiras, as empresas portuguesas já existentes e implantadas fechavam às catadupas, incapazes de competir cá de igual para igual com gigantes estrangeiros apoiados pelos respectivos governos, e muito menos de exportar, e com tudo menos ajudas do Estado Português. Perderam-se grandes nomes da indústria, desbaratou-se experiência, tecnologia, meios e capacidade instalada, desfizeram-se equipas competentes, e empobreceu-se o país.
Hoje, em tempo de vacas muito magras, cada país tenta travar a saída de divisas e está a preferir o que produz. E nós, embriagados no consumo de marcas estrangeiras, já pouco podemos produzir.
Este modelo, de substituir produtos próprios por importações (a suprema estupidez!), de depender de capitais e centros de decisão estrangeiros para investir, para saber fazer e poder vender, falhou rotundamente e está acabado. Nem poderia ser de outra maneira: é o que acontece fatalmente quando confiamos a nossa sobrevivência a outros que não nós mesmo.
É preciso reconstruir a produção em Portugal. É preciso voltar ao que é seguro e àquilo com que sempre pudemos contar: nós mesmos, e os nossos próprios recursos.
Nos anos 80, e perante o fim deste modelo motivado pela adesão à CEE, foi um grande objectivo do governo de Cavaco Silva atrair o investimento estrangeiro para a construção de uma grande fábrica de automóveis moderna, que desse vazão à indústria de componentes automóveis entretanto herdada, e cujas exportações ajudassem a diminuir o enorme desiquilíbrio de transacções externas que começava a fazer sentir.
Já antes tinha havido tentativas nesse sentido desde os anos 60, junto de vários construtores. No início dos anos 70, com a Alfa-Romeo, propôs-se Sines, para produzir o Alfasud. No final dos anos 70 e princípios dos anos 80, com a Ford, Citroën e Renault, a todos sendo proposto Sines ou Setúbal. Só o último resultou mas de forma deficiente: sendo a Renault uma empresa pública francesa, o projecto assumiu contornos de ajuda económica, com os franceses a ditarem as condições, dispersando a produção para Aveiro (o que permitia trabalhar com as fábricas espanholas, mas menos bem com a de Setúbal), e sem a parte mais importante e cara, a oficina de fabrico de componentes de paineis de carroçaria (a "press shop"), que viriam de Espanha. Na prática, ficou-se com mais uma linha de montagem semelhante a outras que já existiam, desta vez a consumir mais componentes portugueses, e com enormes ajudas e favorecimentos por parte do Estado, que era sócio na Renault Portuguesa. Criou postos de trabalho, ao mesmo tempo que, devido à crise, fechavam outras fábricas de montagem portuguesas. As empresas de componentes, essas sim ganharam encomendas e uma injecção de tecnologia e eficiência. No final dos anos 90, e dada a atracção por investir no Leste, a Renault (isto é, o Governo Francês) achou que já tinha ajudado Portugal o suficiente e fechou a fábrica.
No projecto Autoeuropa (na altura projecto Ford-Volkswagen), o Governo teve o bom senso de aprender lições dos projectos anteriores, e procurou não repetir os erros. Setúbal foi logo avançada como localização preferencial, em vez de Sines, e exigia que a fábrica dispusesse de "press shop". Na corrida à fábrica da joint-venture Ford-VW estava Portugal (Setúbal), a então Checoslováquia (Bratislava), e Espanha (três localizações). A Ford, que tinha estudado Setúbal anteriormente, fez a nova análise de projecto, análise essa que incluia 190 critérios, que íam desde as acessibilidades, à disponibilidade de fornecedores locais, à rede eléctrica, qualidade do ensino, sistema de saúde pública, segurança, eficiência dos transportes públicos disponíveis para os trabalhadores, às leis laborais e frequência da ocorrência de greves e, obviamente, impostos e ajudas estatais.
A localização de Setúbal pelo excelente acesso às rotas marítimas, a meio caminho entre o norte e o sul da Europa, foi um ponto muito forte. Mas, no final, a Ford escolheu uma localização em Espanha. O mesmo fez a VW, mas em local diferente. Não chegando as duas empresas a um acordo sobres essas, e descartando Bratislava, debruçaram-se de novo sobre a terceira localização em Espanha - Huelva - e Setúbal. Huelva também tinha boa acessibilidade marítima, tinha uma avaliação geral melhor que Portugal, e os governos central e regional estavam dispostos a conceder ajudas generosas. Perante isto, o Governo de Cavaco Silva respondeu com o único argumento que restava: dinheiro.
Era um projecto essencial para o país, perante a desindustrialização que se estava a dar e, com a aproximação das eleições de 1991, o Governo Português abriu realmente os cordões à bolsa para ganhar a corrida. Cobrindo sempre cada novo valor apresentado pelos espanhóis, chegou-se a um ponto em que estes desistiram de dar mais. Ganhou Portugal, mas com ajudas gigantescas, num excelente negócio para a Ford-Volkswagen.
A produção do MPV (o monovolume VW Sharan/Ford Galaxy/Seat Alhambra) começou em 1995, com 55% de incorporação nacional, sendo que dos 45% importados, a maior parte vem de Espanha. Apesar do grande sucesso, a Ford abandonou o projecto passando a ser apenas VW. Mas, e apesar de ser a fábrica mais eficiente de todas as da VW, a capacidade instalada só foi bem aproveitada nos primeiros anos. A vinda de um segundo modelo demoraria anos a ser conseguida. O governo de Durão Barroso/Paulo Portas propôs a Sodia, a antiga fábrica Renault em Setúbal à VW, em que a produção do pequeno VW Lupo seria uma das contrapartidas da compra de submarinos de fabrico alemão para a Marinha Portuguesa. À VW, o que interessava era aproveitar Palmela, mas os novos modelos persistiam em não vir para Portugal. Finalmente, e sendo um das contrapartidas dos submarinos, veio a produção do VW Eos, mas com muito pouca incorporação nacional.
Mais tarde veio outro modelo de nicho, o Scirocco, de novo com grandes ajudas do Estado e poucas peças portuguesas, e chegou-se mesmo a falar no Polo. Mas com a crise, está de novo em cima da mesa a ameaça do fecho da Autoeuropa. Se das outras vezes, talvez tenha sido uma ameaça negocial para obter mais apoios do governo, agora o cenário é outro: o de crise, de excesso de capacidade instalada, e de proteccionismo alemão.
E aqui é que está a questão que agora afecta economia portuguesa em geral. Durante décadas, os governos portugueses abriram portas à concorrência estrangeira, e apoiaram fortemente o investimento estrangeiro, por vezes fraudulento. E enquanto se deram facilidades e muitos e muitos milhões a empresas estrangeiras, as empresas portuguesas já existentes e implantadas fechavam às catadupas, incapazes de competir cá de igual para igual com gigantes estrangeiros apoiados pelos respectivos governos, e muito menos de exportar, e com tudo menos ajudas do Estado Português. Perderam-se grandes nomes da indústria, desbaratou-se experiência, tecnologia, meios e capacidade instalada, desfizeram-se equipas competentes, e empobreceu-se o país.
Hoje, em tempo de vacas muito magras, cada país tenta travar a saída de divisas e está a preferir o que produz. E nós, embriagados no consumo de marcas estrangeiras, já pouco podemos produzir.
Este modelo, de substituir produtos próprios por importações (a suprema estupidez!), de depender de capitais e centros de decisão estrangeiros para investir, para saber fazer e poder vender, falhou rotundamente e está acabado. Nem poderia ser de outra maneira: é o que acontece fatalmente quando confiamos a nossa sobrevivência a outros que não nós mesmo.
É preciso reconstruir a produção em Portugal. É preciso voltar ao que é seguro e àquilo com que sempre pudemos contar: nós mesmos, e os nossos próprios recursos.
domingo, 17 de maio de 2009
quarta-feira, 13 de maio de 2009
The discovery of powder
O óbvio, há décadas sabido, repetido pela Economist:
«To improve its performance, Portugal needs more flexible labour laws, less bureaucracy, a better educated workforce, more competition and a smaller state. As the IMF states in a recent report, the country’s fundamental problems are domestic, not global, in nature. But political leaders find reforms hard to push through.»
«To improve its performance, Portugal needs more flexible labour laws, less bureaucracy, a better educated workforce, more competition and a smaller state. As the IMF states in a recent report, the country’s fundamental problems are domestic, not global, in nature. But political leaders find reforms hard to push through.»
quinta-feira, 7 de maio de 2009
Perguntas Proibidas
...É um excelente programa da Rádio Europa em parceria com o Instituto da Democracia Portuguesa, que debate questões importantes mas pouco tratadas pela imprensa em geral. Como é dito no site do IDP, nos tempos da Inquisição, proibiam-se as respostas. Será que - com a liberdade de imprensa - se proíbem agora as perguntas?
O programa vai para o ar todas as Quintas-feiras, depois das 18h, em 90.4 FM, com os programas colocados online, em podcast, dias mais tarde.
Chamo particularmente a atenção para o programa de 23 de Abril sobre os assuntos do mar, em que, de forma sucinta, os menos conhecedores poderão ficar com uma ideia muito aproximada do que se passa e do que deveria ser feito. Aconselho vivamente.
Perguntas Proibidas em Podcast
Rádio Europa
O programa vai para o ar todas as Quintas-feiras, depois das 18h, em 90.4 FM, com os programas colocados online, em podcast, dias mais tarde.
Chamo particularmente a atenção para o programa de 23 de Abril sobre os assuntos do mar, em que, de forma sucinta, os menos conhecedores poderão ficar com uma ideia muito aproximada do que se passa e do que deveria ser feito. Aconselho vivamente.
Perguntas Proibidas em Podcast
Rádio Europa
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Eficiência energética,
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