Nunca fui um entusiasta do Euro: concordei que tivéssemos aderido à moeda única por puro pragmatismo. Primeiro, porque assim os políticos portugueses estavam impedidos de desvalorizar a moeda; segundo, porque a adesão implicava a imposição de alguma disciplina nas contas públicas; terceiro, porque obrigava a economia portuguesa a modernizar-se e a tornar-se mais eficiente, por já não poder contar com a "batota" das desvalorizações da moeda. Dez anos volvidos, tenho de reconhecer que os dois últimos argumentos falharam redondamente: estamos falidos e a nossa economia continua a ser tudo menos competitiva no contexto europeu. Em ambos os casos, a culpa foi dos governos portugueses e da complacência de Bruxelas. Razão pela qual, na minha opinião, continua válida a nossa pertença à moeda única: se saíssemos seria para o governo português desvalorizar o Escudo de imediato, o que não é razoável.
O que aconteceria se Portugal anunciasse que abandonaria o Euro e retomaria o Escudo de forma a poder desvalorizar a sua moeda, e assim tornar as exportações mais competitivas? Simples: o Euro continuaria a existir e os portugueses correriam aos bancos para levantarem o seu dinheiro (em Euros) antes que desvalorizasse. Rebentava o sistema financeiro português.
Mas mesmo ignorando esta consequência imediata, o facto de irmos desvalorizar o Escudo seria por si só negativo. O que é que aconteceu nos 20 anos a seguir ao 25 de Abril em que desvalorizámos o Escudo consecutivamente foi que se desvalorizaram os capitais nacionais, os salários, as reformas, as rendas. O que já não foi pouco e, embora ninguém apareça a apontá-la, é uma das razões para a falência em que estamos. Se voltássemos a fazer isso, retomaríamos a receita para o desastre, mas agora também aumentaríamos a dívida externa contraída e os fluxos de capitais correspondentes às importações, nomeadamente a factura energética.
Por isso, falar em sairmos do Euro não é sequer uma opção. Só nos conviria voltarmos ao Escudo apenas se a moeda única acabasse no seu todo, para toda a gente. O que não é uma hipótese a excluir, da maneira como a União Europeia se afunda na decadência, sem que possamos fazer o quer que seja, num sentido ou noutro.
O que devemos, responsavelmente, fazer é preparar-nos para esse cenário, caso se verifique. É outra grande tarefa a somar à recuperação das contas públicas.
4 comentários:
Concordo, JQ. Embora se calhar não devêssemos ter aderido ao euro, pois a nossa economia não estava de facto preparada para ele (a UE devia ter exigido uns anos de estabilidade antes de aceitar a adesão dos países), sair nesta altura, sozinhos, seria catastrófico.
Há quem proponha a saída, com o argumento que seria um tratamento radical e se sofreria de uma vez só, mas há radicalismos que matam.
Concordo inteiramente com este texto.
Apoiei o Euro acima de tudo, porque era uma forma de haver mais rigor com as nossas finanças e com a nossa economia. Deixava de ser possível fazer a «batota» da desvalorização da moeda, que só servia para «tapar o sol com a peneira», não resolvendo os problemas de fundo da nossa economia.
Lembro-me que em 1978 1 Dólar valia 50 Escudos, mas em 1997 altura em que fui pela 1ª vez aos Estados Unidos, 1 Dólar já valia 180 Escudos, e só uma palavra me ocorre para descrever esta situação: Vergonha!
Não é possível um país viver nesta desvalorização permanente, simplesmente não é política economica digna de um país que quer singrar.
O Euro impediu esta «batota» e criou mais exigência, já que era necessário produzir riqueza e ser-se competitivo economicamente com uma moeda tão forte, o que infelizmente não foi o caso nestes últimos 10 anos.
Sair do Euro não deve ser sequer equacionado:
1º De facto quando eu soubesse que Portugal fosse sair do Euro, a 1ª coisa que faria, era ir ao meu banco e levantar todos os Euros que lá tivesse e depositá-los, quiçá, no estrangeiro. É certo que muitos portugueses fariam o mesmo, o que estrangularia o sistema fincanceiro português.
2º De regresso ao Escudo, este iria desvalorizar de imediato e no mínimo 30%, ou seja, 1 Euro passaria a valer à volta de 260 Escudos. Podia estimular as exportações, mas seria um desastre para Portugal, já que seria uma moeda que ninguém queria e assim os credores internacionais de Portugal, jamais iriam ver o seu dinheiro e por conseguinte, jamais nos emprestariam dinheiro.
3º Por último, soube bem quando estive na Califórnia em 2008, saber que 3 dólares equivaliam apenas a 2 Euros. Com o Escudo de volta, também seriam estes pequenos prazeres que se perderiam.
Gi: temos de tirar a UE de nós, e não a nós da UE :)
Paulo Lisboa: Eu lembro-me do choque emocional que foi quando a Peseta passou a valer mais que o Escudo. Foi em 1983, se não me engano.
A Peseta passou a valer mais que o Escudo em 1981. É um pormenor. O que é importante destacar, é que a política económica-financeira de Portugal foi sempre feita com base na desvalorização da moeda, chegou-se até a dizer que era uma desvalorização deslizante do Escudo. Mas como já se viu, essa política não serve, daí também a minha feroz oposição em voltar ao Escudo.
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