sexta-feira, 23 de novembro de 2007

Para ganharmos todos

Este Outono arrancou em força a campanha «Compro o que é nosso», promovida pela Associação Empresarial de Portugal, como forma de incentivar a preferência de produtos portugueses. Campanhas semelhantes existem noutros países, mas em Portugal esta é especialmente necessária porque, em boa verdade, serão raros os países onde os consumidores sejam tão relutantes em relação à compra dos seus próprios produtos. Por ignorância, complexos de inferioridade ou simples (e estúpido) snobismo, o consumidor português sempre teve queda para presumir que o que é nacional é mau, apesar do slogan publicitário em sentido contrário popularizado por uma conhecida marca de bolachas.


Como em todos os países, em Portugal fazem-se bons e maus produtos. Felizmente que muitos são de boa qualidade, não poucas vezes superior ao que é importado e domina o mercado. Infelizmente esse domínio acontece porque o consumidor muitas vezes nem sequer reconhece um bom produto quando o tem à sua frente, deixando a sua decisão de compra residir na aparência, ou tão simplesmente na marca, pensando adquirir um determinado status apenas por a ostentar - mesmo que isso signifique pagar um preço absurdo por um produto de qualidade inferior.

Esse é um factor que tem sido determinante no virar de costas do consumidor português em relação aos produtos portugueses. Por vezes nem sequer existem defeitos a apontar a um determinado produto português, sendo de boa qualidade, boa aparência e bom preço, mas nem assim as pessoas se decidem a comprar, preocupadas que estão com o que é que os amigos e colegas vão pensar quando os virem com um produto de marca portuguesa.

Um comportamente de auto-desqualificação absurdo e anormal - sobretudo quando comparado com o dos consumidores dos outros países desenvolvidos - e que leva à situação (igualmente absurda, mas compreensível) das empresas portuguesas advogarem a qualidade dos seus produtos com o sucesso na exportação dos mesmos, a tal ponto é grande o complexo de inferioridade que temos. Nem sequer confiamos na nossa própria capacidade de avaliação!

As consequências desta maneira de agir para a nossa economia são ruinosas, não só pela perda de riqueza para vai para o estrangeiro cada vez que se compra um produto importado em desfavor de um produto nacional equivalente, mas também pela constante desvalorização da credibilidade e auto-estima, inibindo o nosso espírito de iniciativa e arruinando a nossa credibilidade externa. Se Portugal hoje é um país em acelerado processo de desindustrialização em muito se deve a esta mentalidade. Sem dúvida que é, como sempre foi, mais fácil e prático importar produtos e vendê-los. Mas - escusado será dizer - isso conduz não só à não produção de riqueza e à sua transferência para fora do país, mas também à sua menor distribuição, uma vez que envolve infinitamente menos mão-de-obra. Muito mais do que a tão apregoada fuga ao fisco, é a substituição de produtos portugueses por estrangeiros o factor que mais tem contribuido para as desigualdades na distribuição de riqueza que se verificam (e agravam) em Portugal.



Se o consumidor português preferisse ou, pelo menos, não descartasse os produtos e serviços portugueses, não haja dúvida que Portugal seria um país mais próspero e com muito menos desemprego. E se as empresas portuguesas fossem mais sólidas (em especial as pequenas e médias), a pressão sobre o poder político para governar bem o país seria maior e mais generalizada, e não apenas privilégio de uma mão-cheia de grandes grupos económicos.



É, portanto, urgente mudar de mentalidade. Exportar é bom e prioritário mas não podemos esperar que os outros comprem os nossos produtos se nós próprios os rejeitamos e desqualificamos. E o nosso mercado, que o facilitismo de alguns sempre classifica de demasiado pequeno, parece não ser assim tão desinteressante para as empresas estrangeiras: dez milhões de consumidores europeus não é nada de se deitar fora. É do nosso interesse mudar a nossa maneira de pensar não só porque a economia portuguesa atravessa uma grave crise mas também porque frequentemente o consumidor fica directamente a ganhar ao preferir um produto português pela sua melhor relação qualidade-preço. E, ao preferirmos produtos nacionais, ficamos todos a ganhar.


Compro o que é Nosso

Imagens de produtos portugueses: barco San Remo 740 Sport; frigorífico digital Meireles NFR 51 WD S; carrinho de bebé Bebecar Racer ST; capacete tri-composito Nexx XR1 Speed; Sumol morangos; consola GPS NDrive G500; colecção Outono-Inverno 2007-8 Ana Sousa.

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