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É a austeridade à francesa. Justificando com a saúde pública e o aumento da receita, François Hollande anunciou que vai aumentar a carga fiscal sobre a cerveja em 160%. O presidente francês espera com isso arrecadar mais 480 milhões de euros, quantia que será atribuída a funções sociais.
Aumentar um imposto sobre o consumo em 160% parece à primeira vista uma medida tresloucada e contraproducente. Mas vejamos com mais atenção: França é dos países europeus com mais baixo consumo de cerveja per capita, representando apenas 16% das vendas de bebidas alcóolicas. Um terço é importada (sobretudo da Alemanha e da Bélgica) enquanto que a indústria cervejeira em França é dominada por multinacionais holandesas, dinamarquesas e belgas. A indústria em si não representa muitos postos de trabalho, já que não implica muita mão-de-obra. Ao aumentar o preço da cerveja, a fiscalidade francesa está a torná-la menos competitiva com aquela que continua a ser a bebida nacional francesa: o vinho, que representa 62% do consumo de álcool (a combater o alcoolismo, faria mais sentido começar por aqui, o que não acontece). O vinho exige muito mais mão-de-obra, gera incomparávelmente mais emprego e, ao invés de umas tantas fábricas de multinacionais estrangeiras, dá trabalho a milhares de produtores e adegas, em França e propriedade de franceses. Diminuindo o consumo de cerveja, diminuem também as importações e a saída de divisas.
Beber vinho dá de comer a um milhão de franceses? Provavelmente até mais, mas essas coisas não se podem dizer assim. É melhor justificar com o combate ao alcoolismo e as receitas para fins sociais. Chamem-lhes parvos.
Dedicado ao Lycée Français Charles Lepierre, o liceu francês de Lisboa, que ontem celebrou sessenta anos de existência. Bon Anniversaire, mon vieux!
Na Quarta-feira, numa esquina de Chigado em frente a um centro comercial onde em tempos existiu uma certa geladaria Baskin-Robbins, foi descerrada esta lápide que assinala o local onde Barack e Michelle Obama se beijaram pela primeira vez:
«On our first date, I treated her to the finest ice cream Baskin-Robbins had to offer, our dinner table doubling as the curb. I kissed her, and it tasted like chocolate.
President Barack Obama
(...)
On this site, President Barack Obama first kissed Michelle Obama»
Resta saber se os locais onde ocorreram os outros momentos marcantes na vida amorosa do casal também passarão a ser assinalados da mesma forma. Eu refiro-me, naturalmente, a onde ele lhe cantou a primeira serenata, o lago onde andaram de barco a remos pela primeira vez...
Foi um dos momentos épicos do desporto português: a vitória de Carlos Lopes na maratona dos Jogos Olímpicos de Los Angeles, em 1984, que deu a primeira medalha de ouro olímpica a Portugal. É considerada por alguns como a melhor e mais disputada prova de maratona corrida até hoje, não só pelo gabarito dos atletas presentes (de que se destacava o então recordista mundial, o australiano Robert de Castella) mas também devido ao muito calor que se fez sentir e que levou a que boa parte dos concorrentes ficassem pelo caminho. Carlos Lopes, então com 37 anos, tinha treinado para essas condições habituando-se a correr com duas sweat-shirts vestidas.
Fui um dos muitos que ficaram a assistir à transmissão em directo, madrugada fora (a prova começou à uma da manhã, hora do continente). Uma transmissão televisiva bastante irritante, que deu sempre o protagonismo aos atletas anglosaxónicos mesmo que não fossem à frente. Mas emocionante até ao fim e especialmente quando, a poucos quilómetros da meta, ficou claro quem iria ganhar. Foi uma visão extraordinária a entrada de Carlos Lopes no Los Angeles Memorial Coliseum, com quase meio quilómetro de avanço e uma passada formidável, sob os aplausos de um público que se pôs de pé. Portugal demorou até conseguir ouro olímpico, mas quando o fez foi pela porta grande, na prova-raínha dos Jogos e com direito a novo record olímpico.
Outros videos mais longos com as transmissões britânica e mexicana.
Perdemos hoje uma das nossas últimas figuras que se podem considerar referências nacionais. José Hermano Saraiva há muito que tinha adquirido o estatuto de autêntica instituição nacional. Daquelas pessoas grandes demais para poderem ser reclamadas ou rejeitadas por este ou aquele grupo. Era de todos nós, porque se dedicou a todos nós, Portugueses. Porque nos ajudou a descobrir-nos a nós próprios como Nação e como Povo, através do que fomos e do que somos. Um gigante da consciência nacional e um bastião contra o negativismo anti-português vigente. Era também uma daquelas figuras com que algumas gerações de portugueses cresceram no tempo em que havia apenas uma estação de televisão, e em que esta verdadeiramente prestava um serviço ao país. Fica a obra e a memória de um homem digno como poucos.
Recordo um momento de grandeza. Em 2003, o país assistia chocado às revelações do caso Casa Pia. No mesmo dia, Herman José teve, pela manhã, de prestar declarações ao DIAP e, à noite, apresentar a gala dos Globos de Ouro da SIC. Para Herman, terá sido um dos piores dias da sua vida, de manhã numa atmosfera de linchamento mediático, à noite num ambiente pesado e tenso em que se percebia que toda a gente mantinha-se à distância do humorista, como se de repente tivesse lepra. José Hermano Saraiva recebeu nessa noite o galardão em reconhecimento da sua carreira mas, ao receber a estatueta, em vez falar de si pediu ao público uma salva de palmas para Herman José, por «há anos fazer o melhor que se pode fazer por um país: fazê-lo rir». A sala do Coliseu correspondeu de forma apoteótica. Atitudes que só os homens grandes tomam.
Descanse em Paz, Professor José Hermano Saraiva, e muito obrigado por tudo quanto nos transmitiu.
Parece mau demais para ser verdade.
Cortesia da emissão da Televisão de Angola, fiquei a saber - talvez muita gente já soubesse mas eu pessoalmente não sabia - da nova "modernização" da Língua Portuguesa que está na calha. Chama-se Vocabulário Ortográfico Comum, e será um dos temas a serem tratados, entre amanhã e Quinta-feira, em Luanda, no Colóquio Internacional «O Português nas Organizações Internacionais», uma iniciativa do IILP – Instituto Internacional da Língua Portuguesa, em parceria com o Ministério das Relações Exteriores de Angola.
Em que consiste o Vocabulário Ortográfico Comum? Simples: em integrar na Língua Portuguesa todos os vocabulários em uso nas línguas autóctones de países lusófonos. Por exemplo, e tal como explicou o director-executivo do IILP, o professor brasileiro Gilvan Müller de Oliveira, as palavras das línguas bantus de Angola ou dos dialectos dos índios amazónicos passarão a fazer parte da Língua Portuguesa, podendo ser usadas em pé de igualdade com as palavras do Português original e no mesmo texto, na mesma frase. Ou seja, será possível usar na mesma frase termos mauberes, kikongos e tupinambás, sempre sem deixar de falar Português. E estamos realmente a falar de todos os vocábulos dessas línguas, uma vez que o processo de recolha dessas palavras em línguas locais será feito com recurso a programas informáticos funcionando na internet, efectuando um rastreio a sites ou documentos PDF à procura de novas palavras, que assim serão registadas e integradas automáticamente na base de dados que constituirá o VOC.
É claro que a cada novo vandalismo com a cultura portuguesa surgirão sempre ardentes defensores da "evolução", e da "dinâmica" cultural, com argumentos em favor da aproximação de gentes e de formas de encarar o mundo. Outros justificarão com razões geopolíticas de que Portugal tem de acompanhar o processo. Melhor compreensão é que seguramente não poderá ser argumento.
De acordo com o anunciado, o colóquio poderá ser seguido pela internet, seguindo as indicações do blogue do IILP em: http://iilp.wordpress.com/
Em 1976, quando François Hollande se apresentou para cumprir o Serviço Militar, nos exames físicos foi-lhe detectada miopia, o que levou a que fosse dispensado. No entanto, o jovem Hollande preparava já uma carreira política e estava consciente que o facto de não ter cumprido o Serviço Militar poderia prejudicá-lo mais tarde. Logo após se inscrever na ENA (École Nationale d'Administration, o principal viveiro da classe dirigente francesa) pediu um novo exame físico que desta vez lhe foi favorável. Incorporado, foi colocado com a patente de aspirante no 71º Regimento de Engenharia de Oissel, perto de Rouen, sua terra-natal.
Mas para isso teve antes que receber formação como oficial, ingressando na Academia Militar de Coetquidan, onde teve como colegas de pelotão de instrução Michel Sapin (também aluno da ENA; ministro em vários governos socialistas), Jean-Pierre Jouyet (colega de François Hollande, Ségolène Royal e Dominique de Villepin na ENA, Curso Voltaire; ex-chefe de gabinete de Jacques Delors na Comissão Europeia; ex-director do Tesouro; secretário pessoal do primeiro-ministro socialista Lionel Jospin aquando da adesão ao Euro; ex-presidente do Clube de Paris; ex-administrador não-executivo do Barclays Bank France; ex-chefe da Inspecção Geral de Finanças; ex-Secretário de Estado dos Assuntos Europeus do governo François Fillon; actual presidente da Autoridade dos Mercados Financeiros; casado com Brigitte Taittinger, da família dona da famosa marca de champanhe Taittinger) e Henri de Castries (Conde de Castries; colega de François Hollande na ENA, do mesmo Curso Voltaire [nome do curso escolhido pelos alunos]; ex-membro da direcção do Tesouro; inicia a carreira na seguradora AXA em 1989 e é CEO desde 2000; é director da Comissão de Coordenação do Clube de Bilderberg; próximo de Nicolas Sarkozy e de François Hollande; descendente do Marquês de Sade).
Como se vê, tudo gente de meios modestos e com um percurso de vida perfeitamente normal.
Curta mas relevante, a conferência de imprensa de Pedro Passos Coelho e Mariano Rajoy na Cimeira Luso-Espanhola (que os idiotas da televisão estatal insistem em chamar de "ibérica", precisamente o termo que a diplomacia portuguesa quer evitar). Esta cimeira, suposta realizar-se anualmente, não se realizou nos últimos anos pela simples razão que o governo de Zapatero não queria tirar fotografias ao lado de Sócrates e sus muchachos. Mas esta cimeira é diferente pelo momento de crise económica que afecta Espanha e de relações de poder dentro na União Europeia. Não por acaso foi agendada para hoje, "Dia da Europa", desvalorizando a "efeméride". A Espanha de Rajoy não aceita que situação económica seja usada para diminuir o seu prestígio e a sua posição como potência emergente e deixou isso claro quando disse, de peito aberto, que não iria cumprir a meta para o déficit público.
Nos discursos, ficou evidente a diferença entre os governos: entre os que sabem o que é governar, e os outros que acham que governar é anunciar medidas avulsas e, de quando em vez, dar uma explicação sobre o que estão a fazer.
Passos Coelho discursou para português (e, com alguma sorte, espanhol) ouvir enumerando as medidas acordadas entre ambos os governos para cooperação nisto, entendimento naquilo, abordagem comum para aqui e para ali.
Já Mariano Rajoy falou para ser ouvido na Europa, e sobretudo em Paris e Berlim, sobre a estratégia para combater a crise económica a nível continental. Sem condescendência para com o tradutor simultâneo, falou depressa e foi rapidamente ao cerne da questão: Espanha rejeita por completo a anti-austeridade defendida por François Hollande. Rajoy defende para a Europa a mesma estratégia que aplica em casa e que se baseia em três pilares: primeiro, austeridade (não gastar aquilo que não se tem) e controlo do déficit; segundo, sustentabilidade da dívida; e terceiro, crescimento por via de reformas estruturais, dinamizando o mercado interno.
Passos Coelho, nitidamente subalternizado pelo tema, pareceu ter sido apanhado de surpresa pelo alcance do discurso (o que não é suposto acontecer), com semblante de quem estava claramente «out of his depth»: os politicos portugueses não estão habituados a grande política, que é um campeonato que só conhecem pela televisão.
Não se esquecendo que estava em Portugal, Rajoy disse que a cimeira luso-espanhola servia para relançar as relações entre os dois países (depreendendo-se que tenham passado por um mau momento), referiu-se à importância de ambos os mercados como destino de exportações em ambos os sentidos, e das vantagens da cooperação e entre-ajuda. Pouco mais se referiu a Portugal em concreto e com relevância, não sem deixar de lembrar que - tal como a Grécia - o país foi intervencionado.
Passos Coelho correspondeu com um auto-elogio, na forma de um elogio aos esforços do novo governo de Madrid para restaurar a confiança dos mercados nas finanças espanholas, e nas corajosas reformas que está empreender.
É uma inevitabilidade que nas cimeiras luso-espanholas Portugal apareça subalternizado, e para tal basta a diferença de mentalidade e de postura entre os políticos dos dois lados. Não estamos propriamente a falar de Franco e de Salazar, que jogavam no mesmo campeonato e apareciam em pé de igualdade. No geral, os políticos espanhóis interiorizaram o projecto nacional de fazer Espanha voltar a ser uma das grandes potências europeias e uma com projecção mundial, nomeadamente no seu espaço de influência cultural. É algo que vem desde a derrota na guerra com os Estados Unidos, em 1898, altura quem que a sociedade espanhola sentiu que o país tinha batido no fundo e que tinha que recuperar da decadência para ocupar o seu lugar de direito na hierarquia internacional. Um século depois, após atravessar crises políticas e uma guerra civil que a deixou em ruínas, a Espanha conseguiu alcançar muito do pretendido e hoje reclama um lugar no G-8. Por isso, não aceita agora que a crise económica a obrigue a retroceder nesse processo, muito menos por diktat da Alemanha e de França.
Do lado português, a diferença de mentalidade é obviamente abissal e escusado será desenvolver o tema. Na cimeira luso-espanhola de 1992, Cavaco Silva foi ao ponto de obsequiar Felipe Gonzalez com a promessa que no ensino português o programa de História iria ser revisto de forma a ser mais simpático para com Espanha. Por exemplo, passaria a ensinar-se que a Batalha de Aljubarrota tinha sido, não a monumental derrota castelhana que foi, mas antes um empate e um acidente no bom relacionamento entre os dois povos - honra seja feita ao jornal Expresso, o único que na altura reparou nesta questão. Felizmente que muito do que é assinado nas cimeiras não é cumprido.
À diplomacia espanhola nunca interessa que Portugal apareça na cena internacional. A menos que queiram falar com os europeus maiores, e para isso os espanhóis recorrem ao escadote português, sempre disponível e honrado por tão nobre tarefa. Por isso, esta cimeira "ibérica" foi tão oportuna para Madrid.
Como era óbvio:
«Bruxelas diz que Pingo Doce não violou regras
Felizmente que a Dra. Cristas é jurista. Imagine-se o que seria se fosse apenas uma ignorante a tentar agradar à populaça de esquerda.
Dr. Portas, Dr. Portas... Sinceramente.
Agora vem a parte mais difícil.
Uma das bandas de maior sucesso dos anos 60, os madeirenses Conjunto Académico João Paulo. Tema de 1965.
A tal que alguns dizem que não é precisa. Dizem que basta ter uma guarda costeira para defender os cardumes, travar lanchas com droga e recolher poluição na nossa costa, que para o resto, existe a NATO e a União Europeia. Lá segue uma fragata, daquelas que nos anos 80 meio burgo dizia que não eram precisas, e uma corveta com mais de 40 anos, ainda daquelas encomendadas por Salazar e inauguradas por Caetano. Foram projectadas para durar 25 anos, pelo que deviam ter sido substituídas há 15. Mas no entretanto tem havido prioridades inadiáveis como estádios sem uso, auto-estradas sem trânsito, aeroportos sem aviões, e uma enorme ZEE de desperdício e esbanjamento em todas as latitudes, longitudes e profundidades.
«Siga a Marinha!» A que ainda temos e que é a mesma instituição que foi a maior do mundo no seu género durante dois séculos, que a dada altura dominou três oceanos, que se estendeu do interior da Amazónia ao Mar do Japão. Que combateu contra espanhóis, mouros, turcos, holandeses, franceses, ingleses, alemães, chineses e indianos. Piratas de cabelo louro e piratas de carapinha. Que cartografou pela primeira vez uma boa parte dos litorais do planeta. Que cunhou termos técnicos usados ainda hoje pelos marinheiros de todo o mundo. Que, apesar de todas as limitações materiais e financeiras, é avaliada como uma das três mais bem treinadas da NATO e das mais eficientes do Mundo.
E como há vida no Mundo para além do déficit, da Moody's e da Troika, mais uma vez lá vão os marinheiros portugueses, aventureiros e sempre os primeiros na Terra ou no Mar. Daqui por uns tempos, depois do problema resolvido e quando tudo já estiver esquecido, lá voltaremos à novela da mediocridade e da pequenez: o caso dos submarinos do Paulo Portas que - dizem os inteligentes - não servem para nada, os discursos sobre o Mar que é o grande futuro de Portugal, a Plataforma Continental que fará a expansão dos bolsos de espanhóis e brasileiros, as pescas que a Europa não nos consente, os estaleiros falidos porque o Estado não é capaz de gerir a ponta de um cabo. "O Mar" já foi; só ainda não arranjaram uma lei para o extinguir ou vender aos chineses. Quanto à Marinha, enquanto houver mares e oceanos e outros países com igual acesso a eles, cujos interesses não serão sempre os mesmos que os nossos, será sempre necessária. E não devia ser preciso uma emergência na Guiné-Bissau para nos lembrarmos disso.